Nunca vivemos um período de tanta conexão, de tantos conhecimentos disponíveis, como agora. Este mundo hiper conectado, por diversos meios, nos permite acesso a praticamente quaisquer pessoas, em qualquer lugar do planeta; nos oferece a possibilidade de aprimoramento individual e coletivo, como nunca em qualquer outro momento de nossa história.
Porém, não se percebe a
melhoria nas relações, não se percebe a evolução da sociedade ou das pessoas,
para um modelo mais solidário, fraterno, com mais empatia e, no caso das
mulheres, mais sororidade.
A imprensa “marrom” alimenta
uma sociedade de merda; o “jornalismo” fofoqueiro amplifica a figura daquele
vizinho, postado o dia todo em sua janela, cuidando a vida alheia e depois
espalhando boatos, criados pela sua interpretação do que pensou ver.
A privacidade é um artigo de
museu. Deixou de existir neste mundo moderno. Mas a exposição da intimidade
ganhou contornos trágicos.
A morte da princesa Diana, em
agosto de 1997, é um dos exemplos deste sórdido comportamento de manada. Não
que sua vida privada fosse interessante ou tivesse algo fora do comum a ser noticiado.
Era apenas uma celebridade, por ter sido casada com um membro da família real
britânica. Mas as pessoas ansiavam por saber de suas desventuras, talvez por
inveja (creio nisto) ou pura maldade mesmo. Perseguida por hordas de
“paparazzi” – que ganham o dinheiro sujo para devassar a intimidade alheia –
perdeu a vida num acidente de carro, ao fugir de seus caçadores.
O mundo digital apenas
potencializou e disponibilizou novas e mais avançadas armas nesta caça,
tornando a disseminação das “fake news” mais eficientes, rápidas e com maior
abrangência. O público a que se destinam, é o mesmo. Nisto, nenhuma mudança.
Só há fofoca, por haver quem
se alimente delas.
Fofoca não é notícia. Fofoca é
uma versão dos fatos, sem qualquer compromisso com a verdade ou com a
profundidade deles.
E são estas pseudonotícias a
alimentarem o fanatismo, a discriminação, o preconceito, o ódio, tendo como
porta vozes as falsas vestais, posando com seu moralismo de cuecas ou
calcinhas.
Isto, senhoras e senhores, é
um ato de violência. Pior que um tapa, um soco, uma surra física…é um lixamento
moral, psicológico, com resultado muito mais traumáticos. O corpo físico se
recupera em alguns dias, algumas semanas, as feridas cicatrizam. Já a psique
levará anos, talvez jamais se curem as chagas deixadas na alma.
Das ditas figuras públicas,
tenho interesse por seu trabalho público: de atores ou músicos, quais trabalhos
fizeram e farão, seus talentos; dos políticos, quais seus projetos para minha
cidade, estado e país, suas ideologias. Pouco me importa como levam suas vidas,
com quem casaram ou separam, se são homo ou heterossexuais. Tais fatos dizem
respeito apenas e tão somente a eles, não é da minha conta.
Há muitos atores e músicos,
engajados em diversos trabalhos e ações sociais, para os quais emprestam sua
figura pública para lhes dar maior notoriedade. Isto sim, é uma boa notícia a
ser propagada e destas tenho interesse.
Marilyn Monroe, cuja vida
pessoal era um prato cheio aos fofoqueiros de plantão, gerando inúmeras
“teorias da conspiração”, teve uma atitude digna, num período conturbado da
história americana, no quesito “segregação racial”. Foi por seu intermédio, que
Ella Fitzgerald pode se apresentar na famosa casa de shows Mocambo. O
proprietário havia cancelado o show ao saber que a cantora de jazz era negra.
Jeri Ryan, atriz norte
americana, mais conhecida por seu papel como “Sete de Nove” no spin-off de Star
Trek, Voyager, é uma ativista atuante nas redes sociais e na vida pessoal,
contra as armas de fogo e pelos direitos civis, principalmente das mulheres.
Jessica Chastain, ganhadora do
Oscar 2022 de Melhor Atriz por sua interpretação em 'Os Olhos de Tammy Faye', é
outra ativista dos movimentos pelos direitos das mulheres, com forte posição
sobre igualdade e contra a violência e abuso contra mulheres. Jessica atua
fortemente na conscientização sobre depressão e auxilia pessoal e
financeiramente organizações que promovem a saúde mental.
Estas sim, são notícias,
informações relevantes, agregando valores positivos. Não é meu interesse saber
se foram traídas ou traíram seus parceiros; se casaram mais de uma vez; se
fizeram topless numa praia ou na piscina de casa.
A imprensa “marrom” e o
“jornalismo” fofoqueiro serão extintos, quando os valores de nossa sociedade
forem melhorados; quando nossa sociedade for capaz de promover mais empatia,
mais solidariedade, mais fraternidade; quando os indivíduos olharem mais para
dentro de si e exorcizarem seus demônios, ao invés de se deleitarem com o
inferno dos outros.
Jornalista e sociólogo
MTb 0018790/RS